sábado, 17 de janeiro de 2015

CANÇÃO (CECÍLIA MEIRELES)

As vezes é preciso naufragar sonhos. Enterrá-los vivos e curar os estragos. No poema "Canção" é disso que Cecília Meireles nos passa com a sua inconfundível lírica.
 
Todos já naufragamos sonhos, as vezes "sonhos reais" demais para serem somente sonhos, não é mesmo? Então, apreciem, mas cuidado para não terem vontade de reabrirem o mar para salvar algum navio.

Canção
 
Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar
 
Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.
 
O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio…
 
Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.
 
Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

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