segunda-feira, 29 de junho de 2015

O SUBDESENVOLVIMENTO É CRESCENTE

Publico, a seguir, texto de autoria do professor e doutor em economia pela Universidade de Hamburgo, Adriano Benayon.
 
Observem, que a dependência, a desconstrução do caráter nacional e a crise econômica, fazem parte de um mesmo elo histórico, muito bem integrado no texto do professor através de itens de fácil entendimento e bem didáticos.
 
O texto a seguir e outros do mesmo autor podem ser lidos no site desenvolvimentistas
 
Crescimento do Subdesenvolvimento, por Adriano Benayon
 
A economia brasileira está seriamente doente. A crise põe-se à mostra: negócios fechando, desemprego crescente, violência e insegurança recrudescendo.
 
2. A atual é uma das muitas provenientes da enfermidade estrutural e crônica que assola o País, há mais de 60 anos. Sem ordem constitucional não há como sair do atoleiro, pois os beneficiários da corrupção sistêmica a institucionalizaram e criaram mecanismos, em todas as esferas do poder, para aprofundá-la.
 
3. Os desequilíbrios agravam-se, porque o poder, sob todos os regimes e governos que se têm sucedido, é controlado pelos que acumulam poder através do dinheiro e faturam com os desequilíbrios.
 
4. Aristóteles ensinou que o hábito forma uma segunda natureza. Então, há muito tempo, através da psicologia aplicada – e utilizando formadores de opinião e o crédito de instituições supostamente científicas – o sistema de poder acostuma as pessoas a ignorar as causas da doença política e social.
 
5. A economia brasileira perde qualidade através da concentração, da desnacionalização, da desindustrialização e do consequente empobrecimento tecnológico.
 
6. Afora a indústria, prejudicada desde meados dos anos 50, as infraestruturas foram deterioradas e privatizadas, principalmente a partir dos anos 90. A regulação dos serviços favorece a manipulação dos preços de suas tarifas e a falta de qualidade, sob o beneplácito das agências, ao bel prazer dos carteis que os controlam.
 
7. Nessas fabulosas negociatas – que a grande mídia nunca denunciou – foram entregues a carteis estrangeiros as infraestruturas construídas e pagas pelo Estado. Além disso, privatizaram-se e desnacionalizaram-se bancos, cada vez mais favorecidos pela legislação e pelo BACEN.
 
8. A entrega dos monopólios das infraestrutura e as normas pró-carteis da precificação de suas tarifas tornaram-se causa maior da alta da inflação.
 
9. Daí também, e em combinação com a produção industrial dominada por carteis transnacionais, advém a perda de competitividade da economia e os déficits nas transações correntes, formadores da dívida externa.
 
10. Na lógica perversa do sistema, em vez de se construir uma infraestrutura eficiente e independente, finge-se combater a inflação através da elevação das taxas de juros.
 
11. Ora, aumentar os juros significa:
1) fazer crescer as insuportáveis despesas financeiras do Tesouro, incapacitando-o de realizar os prementes investimentos de infraestrutura, baixar o “custo Brasil” e melhorar o grau de competitividade;
2) elevar a taxa de inflação, uma vez que os juros são um dos custos de produção, além de dissuadir investimentos produtivos e assim reduzir a oferta de bens e serviços, determinante da alta dos preços;
3) tornar ainda mais concentrada a renda e o poder nas mãos dos oligarcas financeiros: daí ser essa política promovida pelas “autoridades monetárias” e endossada pelos beneficiários das doações de grandes empresas e bancos às campanhas eleitorais.
 
 
12. Mais efeitos estruturais negativos são gerados a pretexto de conter os preços através das importações, deixando de desvalorizar a taxa de câmbio em correspondência com a alta dos preços internos: agrava-se a falta de competitividade da indústria local e aumenta a desindustrialização.
 
13. As empresas estatais foram entregues a preços muito abaixo de seu valor patrimonial, envolvendo a subavaliação dos lances iniciais, o pagamento em “moedas podres” (títulos de dívida desvalorizados) e a participação de fundos de pensão de estatais. Ainda por cima, a União despendeu centenas de bilhões de reais para sanear passivos trabalhistas e financeiros das empresas privatizadas.
 
14. Assim, o Brasil tornou-se a casa da sogra dos carteis. Nas telecomunicações, até as tarifas promocionais são múltiplos enormes das normais do exterior. O serviço é de baixa qualidade, e áreas imensas ficam sem sinal.
 
15. Mudanças na Lei Geral das Telecomunicações (nº 9.472/97) permitiram a operação de telefonia e celular por um único conglomerado, e incentivos à concentração favoreceram as mega-empresas, apoiadas por ANATEL e CADE.
 
16. No sistema elétrico, danos semelhantes ao País: a infraestrutura deteriorou-se, e, desde a privatização, as tarifas elevaram-se em cerca de 150%, acima da alta média dos preços.
 
17. A Petrobrás, foi privada, desde sua fundação, do monopólio da distribuição, o segmento privilegiado da indústria do petróleo, feudo para obter grandes lucros e que nada produz. A estatal já tivera desgastes, mesmo antes dos pesados golpes decorrentes da Lei 9.497 de 1997, entre os quais sua desnacionalização parcial e a perda dos monopólios da prospecção e exploração.
 
18. Desde 1955, a preponderância dos combustíveis fósseis, não-renováveis, esteve associada à deletéria expansão subsidiada da indústria automotiva, nas mãos dos carteis transnacionais, com a míngua de investimentos nas ferrovias e demais meios eficientes e econômicos, como a navegação fluvial e a marítima.
 
19. A mesma linha pró-subdesenvolvimento – característica da política inaugurada em agosto de 1954 – faz que, nas hidrelétricas, a geração de energia seja grandemente diminuída, e os custos elevados.
 
20. As mesmas normas e intervenções falsamente ambientais e pró-indígenas, impedem ou reduzem as eclusas, para grande dano do aproveitamento de rios e canais que tornariam baratíssimo o transporte interior no Brasil.
 
21. A política pró-subdesenvolvimento fez, nos anos 90, entrar em cena os negócios corruptos do gás da Bolívia, em favor das angloamericanas Shell, BP e Enron, tendo o Brasil pagado pelos gasodutos e investido em termelétricas antieconômicas, sem falar nas alimentadas por óleo combustível.
 
22. Ao mesmo tempo, impede-se que a energia de biomassa assuma o lugar principal que deve ter:
1) desvirtuando o Programa do Álcool, criado sob a liderança de Severo Gomes e Bautista Vidal, a partir de 1975; o etanol chegou a suprir integralmente a demanda de veículos novos produzidos no País, antes do final dos anos 80, mas concentrou-se em usinas e plantations gigantescas, que implicam transportar a cana a grandes distâncias e depois o álcool, de volta: a produção descentralizada, e combinada com alimentos, trazia vantagens econômicas, sociais e ecológicas; mas, nos últimos decênios o setor sucroalcooleiro passou a integrar o agronegócio e tem sido desnacionalizado;
2) marginalizando a produção de óleos vegetais, com a escolha de matérias primas e tecnologias erradas, como o biodiesel, além de adotar a lógica concentradora, antieconômica e antissocial, dificultando o acesso ao mercado de cooperativas e pequenos produtores;
3) coerentemente com a opção pela dependência tecnológica, não dando espaço à alcoolquímica e nem à oleoquímica;
4) entre as fontes renováveis de energia, preferindo e subsidiando as de tecnologia proprietária de empresas estrangeiras, como a eólica e a solar.
23. Juntamente com a desorganização econômica, política e social, fortalece-se a ordem colonial sobre o País, enquanto este perde a identidade nacional.
 
24. O caminho para isso tem sido as respostas subalternas dos governos às crises recorrentes derivadas do modelo dependente. Ao contrário do que alegam, as autoridades monetárias não têm como sanear as finanças, levando à estratosfera a dívida do Tesouro.
 
25. Com a composição e capitalização da elevadíssima taxa SELIC, o crescimento dessa dívida compromete, em definitivo, a independência do País.
 
26. No círculo vicioso, a produção e o emprego caem, e os recursos que os viabilizariam, são carreados para o pagamento de impostos, a fim de sustentar rendas exclusivamente financeiras, enquanto definham as suscetíveis de gerar produção.
 
27. A presente crise é pretexto para cortes profundos, também na área militar, vital para que se recupere algum grau de autonomia. Ela perdera substância, quando da crise da dívida externa do início dos anos 80.
 
28. Dita crise resultara da estrutura industrial desnacionalizada e concentrada que fizera acumular déficits externos incompatíveis com a capacidade de pagamento do País.
 
29. Hoje revivemos a daquela época, quando foram desativadas importantes indústrias de defesa, devido à falta de encomendas das Forças Armadas. A partir dos anos 80, não cessaram de ocorrer perdas e desnacionalizações de empresas brasileiras.
 
30. Nos anos mais recentes, após um esforço de ressurgimento, promove-se, de novo, desmonte nas pastas militares, tendo o governo cortado R$ 500 milhões no projeto (KC-390) da EMBRAER, com mais de 1.000 engenheiros e 10.000 técnicos envolvidos. Podam-se também os projetos da HELIBRAS e os dos submarinos.
 
31. Em suma, o País fica sem indústria e sem tecnologia, e à mercê das potências imperiais. O Reino Unido, à frente delas, obteve a demarcação de áreas imensas em Roraima e em outras regiões amazônicas, a pretexto de criar reservas indígenas e ecológicas. Pouco falta para essas áreas serem alijadas do território nacional.
 
32. Todos deveriam saber que o Reino Unido ocupa as Ilhas Malvinas da Argentina há mais de duzentos anos e recusa-se a reconhecer a soberania platina sobre essa área rica em petróleo.
 
34. A realidade do Brasil é a de um país dominado pelas corporações estrangeiras e desestruturado, que sofre assalto antigo, agora em fase aguda, desferido também sobre Petrobrás e à engenharia nacional, cujos conglomerados têm importante atuação nos segmentos tecnológicos da defesa.
 
35. Por que o inimigo ataca, confiante? Por que nem a Petrobrás é mais unanimidade. Porque a coesão nacional foi dilacerada. Porque o País está sem liderança política alguma, digna de crédito, e sem que qualquer dos poderes do Estado o defenda.
 
*- Adriano Benayon é doutor em economia pela Universidade de Hamburgo e autor do livro Globalização versus Desenvolvimento.

quinta-feira, 25 de junho de 2015

POESIA: O AÇUDE

Já faz algum tempo que não publico poesia. Que tal uma do adorável Thiago de Mello? Saboreiem sem nenhuma moderação.
 
 
O Açude            (Thiago de Mello)
 
Não sei nem jamais
saberei o nome
(se acaso tem nome)
do bicho que dorme
no escuro do açude
sem fundo que sou.
 
Nascido, senão
comigo, de mim,
é um bicho, ou como
se fosse; e que dorme.
 
Talvez o agasalhem,
de sono enrolado,
as mais fundas águas
que em minha alma dormem:
- as águas e o bicho,
num sono só, feito
de grávidos nadas
espessos e imóveis.
 
Mas nem sempre imóveis.
 
Um dia estremecem:
sem causa, e de súbito,
um tremor percorre,
longínquo, levíssimo,
o nervo das águas,
- essas águas fundas
que enrolam, dormidas,
o sono do bicho,
que já não é sono:
mal findo o arrepio,
começa a lavrar
o incêndio no açude.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

HORÁCIO MACEDO: UM COLÉGIO SEM PRÉDIO

Hoje, o espaço do blog está cedido para a Comunidade do Colégio Estadual Professor Horácio Macedo, que publica o seu drama, mais um dentre tantos no sistema educacional sob responsabilidade do Governador do Rio de Janeiro, Pezão.
 
Leia o texto de autoria dos professores Mariana G.Barbosa e Leonardo C.Ferreira e participe do abaixo assinado, cujo link se encontra no corpo da mensagem.
 
UM COLÉGIO SEM PRÉDIO
             O Colégio Estadual Professor Horácio Macedo – sempre em destaque por seu ensino de excelência, premiações e bons resultados – sofre o drama de não ter um prédio para funcionar no ano letivo de 2016.
            Desde sua fundação, no ano 2000, a escola estadual manteve suas instalações dentro do campus do CEFET-RJ em Maria da Graça. Isso porque existia entre as duas instituições um convênio que proporcionava ao aluno formação geral oferecida pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro e ensino profissionalizante dado pelo Governo Federal.
            Ao final do ano letivo de 2013, essa parceria extremamente positiva acabou e, naturalmente, o CEFET-RJ solicitou as salas de aula de seu prédio para suas atividades pedagógicas. Desde então, o C.E. Prof. Horácio Macedo vive a angústia e a instabilidade de não ter um prédio próprio para manter sua história de sucesso.
            Devido o Governo do Estado do Rio de Janeiro não ter construído um prédio no prazo solicitado pela comunidade escolar, um acordo foi feito entre a Secretária de Estado de Educação-RJ e o CEFET-RJ para que o colégio permanecesse no prédio federal em 2014. Situação essa que se arrasta até hoje devido a inação da Secretaria de Educação. Por consequência, atualmente vivemos sérias restrições de utilização de espaço que interferem em nosso trabalho pedagógico. A título de exemplo algumas salas de aula foram devolvidas e a quadra de esportes sofre restrições de horário em sua utilização.
            Toda essa situação gera incerteza em relação ao futuro do Horácio Macedo que, segundo a Secretária de Estado de Educação, por três anos consecutivos (2011, 2012 e 2013) apresentou um dos três melhores resultados no ENEM entre as centenas de escolas da rede pública de ensino fluminense.
 
            Na busca de soluções para o problema, os professores, pais e alunos da escola mantêm uma campanha pelo Facebook, através de uma página chamada  Salvando o Colégio Horácio Macedo (clique no nome do colégio) informando à população e pleiteando junto às autoridades estaduais um prédio próprio e, preferencialmente, situado bem próximo de sua atual localização. Só assim a comunidade escolar poderá dar continuidade ao excelente trabalho que vem desempenhando há mais de quinze anos.
Comunidade Escolar do Colégio Estadual Professor Horácio Macedo

sexta-feira, 19 de junho de 2015

AGRESSÃO CONTRA A VENEZUELA

Um grupelho de senadores brasileiros, dentre eles o que há de mais expressivo em matéria de conservadorismo, tais como Ronaldo Caiado do DEM (antigo PFL), Aécio Neves e Aloysio Nunes Ferreira, ambos do PSDB - o partido que vendeu a Vale, o BANERJ, o BANESPA, as distribuidoras de energia elétrica, a EMBRATEL, a EMBRAER, as Telefônicas estaduais e tantas outras empresas brasileiras para grandes grupos econômicos privados nacionais e estrangeiros, foi meter o bedelho no quintal vizinho.
 
Enfaixaram-se de grandes bedéis da liberdade e dos direitos humanos e a pretexto de criarem um certo constrangimento nas relações do governo brasileiro com o governo venezuelano, resolveram visitar opositores venezuelanos que estão presos para verificarem as condições em que tais se encontram.
 
A Venezuela vive um momento decisivo para definir o seu futuro como pátria popular de um povo liberto de séculos de exploração, ou retroceder ao status de país satélite, colônia europeia e norte-americana.
 
É difícil para um país, praticamente sozinho, libertar-se. Figuras como os senadores brasileiros citados, existem por lá aos montes. São as pontas das lanças, cujas mãos que as seguram podem estar na Colômbia, maior parceiro militar dos EUA na América do Sul. A autodeterminação dos povos, direito inalienável do povo de cada país, jamais foi respeitada pelos EUA e só a ingenuidade pode levar a crer que distúrbios provocados pela oposição venezuelana não tem o Tio Sam por trás.
 
O pior de tudo é ouvir o Renan Calheiros dizer que a manifestação de pessoas favoráveis ao regime bolivariano, contra a presença dos senadores brasileiros, é um ato medieval.
 
Medieval é haver em grande escala em todo o mundo a exploração do homem pelo homem, em pleno século XXI. Medieval é o Brasil ter o Senado presidido um pulha!
Há que se considerar que a UNASUL e a OEA são organismos internacionais nos quais a Venezuela tem acento e por isso os legitima. Portanto, discussões, debates, busca de soluções pacíficas, formação de comissões de diálogos e de visitas, devem ficar restritas a tais organismos. Não cabe a nenhum país isoladamente pressionar qualquer dos lados rivais na Venezuela ou em qualquer outro país das Américas.
 
Os senadores do conservadorismo brasileiro cobram que o Brasil se posicione com firmeza contra o regime em vigor na Venezuela, pois sabem que a diplomacia petista privilegia a autodeterminação dos povos e guarda seus posicionamentos para exposição nos órgãos internacionais.
 
Fica fácil concluir, que a bisbilhotagem dos senadores do DEM e do PSDB no quintal da Venezuela, tem como objetivo atingir a cozinha do governo Dilma, pois geraram munição para as grandes mídias que, com esse arsenal, atingirá a opinião dos paneleiros e fará o assunto render por vários dias, sempre com a intensão de pressionar a maioria da classe média contra o governo.
 
Enquanto isso, o Congresso sai de foco e vai aprovando, na calada das noites, projetos como o do senador José Serra do PSDB de São Paulo, que retira a obrigatoriedade de participação da Petrobrás na exploração do Petróleo do pré-sal.
 
Não poderia encerrar, sem deixar uma pergunta para reflexão: Temos, hoje, o Congresso mais conservador das últimas décadas por causa das alianças que o PT fez desde o primeiro governo Lula?
 
 

sábado, 13 de junho de 2015

PT, QUE PARTIDO É ESSE?

O PT é o partido da esquerda controle remoto. Quando o Brasil vivia uma efervescência interna nos anos 50 e início dos anos 60, o partido que condensava em suas bandeiras e ações os interesses do povo brasileiro através de um conjunto de reformas que mexeriam na estrutura do país era o antigo e saudoso PTB.
 
As tais reformas que o PTB pretendia implantar ficaram conhecidas como reformas de base e foram interrompidas por um golpe militar e civil, que para abafar qualquer tentativa de mudança estrutural, perpetuou-se no poder por 21 anos.
 
Ocorre que na segunda metade dos anos 70, articulações de caráter sindical ocorreram na região do ABCD paulista. Houve truculência contra algumas assembleis? Sim. Nada obstante, porém, o proibido foi sendo tolerado.
 
Engana-se quem acha que a tolerância do regime deu-se por conquista da classe trabalhadora daquela região. Parece-me muito mais prudente reconhecer que houve um pouco de cada coisa: conquista sindical e recrudescimento calculado da ditadura.
 
Os militares e civis poderosos avaliavam que era preciso esvaziar a memória da geração que viveu os intensos momentos de luta pela legalidade, comandada por Leonel Brizola e da luta pelas reformas de base sob comando do Presidente João Goulart.
 
Para apagar a memória, teriam que ficar mais 20 ou 30 anos no poder. O cenário internacional não era mais favorável. Sob a presidência de Jimmy Carter os EUA da segunda metade dos anos 70 deram uma guinada na sua estratégia global e exigiam dos "países amigos" a adoção da democracia liberal.
 
O risco de uma abertura imediata era grande, pois a possibilidade concreta do velho PTB ainda ser forte e cativante existia. Daí Geisel vem com a solução do conservadorismo: "abertura lenta e gradual". Com isso agradou os EUA e evitou o risco de eleições presidenciais no início dos anos 80, onde certamente Leonel Brizola voltaria com as reformas de base e com a educação como temas centrais da campanha.
 
Com o tempo ganho, foi possível a fundação do PT em fevereiro de 1980 e a consequente divisão dos intelectuais progressistas. Além disso, o PT recebeu o reforço da igreja católica nos locais mais interioranos. Isso foi fundamental para o partido se tornar uma legenda nacional e colocar um freio em qualquer perspectiva de quebra de estrutura e promoção de mudanças profundas se algum dia viesse a assumir o poder político.
Em artigo escrito esta semana, Eric Nepomuceno sustenta que "o PT teve de se adaptar em 2003 e dar uma face social ao capitalismo." Em outra parte do artigo, o escritor diz: "Mas o PT não mexeu na estrutura do país."
 
É inegável que os avanços sociais foram grandes. Mas, o PT não é um partido com o propósito de promover ruptura. Basta ver quem foram seus principais aliados no parlamento desde 2003.
 
É chocante constatar o que muitos intelectuais de esquerda já escreviam na segunda metade dos anos 80. Muitos, em tom jocoso, chegavam a dizer que o PT é a esquerda que a direita gosta.
 
Sucesso da ditadura que, de forma estratégica, dividiu a esquerda histórica (o velho PTB depois chamado de PDT) da nova esquerda sem história ( o PT ). Claro como a luz mais intensa, foi o fato do PT ter disputado o primeiro turno das eleições presidenciais de 1989, numa clara demonstração de insensibilidade histórica. Uma possível chapa Brizola/Lula faria frente com vantagem sobre o candidato fabricado, Collor de Melo.
 
Com Brizola indo a fundo nas questões estruturais e abrindo fogo contra as "perdas internacionais" e desde o primeiro instante colocando a educação como prioridade, é possível até mesmo acreditarmos que quando chegasse a vez do Lula ele estaria preparado para dar continuidade. Ele compreenderia que não basta criar programas com bolsas para apoiar a vida dos mais pobres, mas que concomitante é fundamental lutar contra as velhas estruturas de poder, que inclusive chegaram a corromper alguns quadros do próprio PT.
 
Hoje, o velho PTB, que é o PDT, virou partido de centro-direita, o PT assumiu a sua condição histórica de crença num capitalismo humanista e as pessoas realmente de esquerda ocupam seu tempo planejando um possível distante futuro, enquanto uma parte simplesmente esta solta por aí sem nenhuma organicidade.
 
Não estarei vivo quando os historiadores escreverem sobre a quantidade de décadas que o PT terá feito atrasar avanços progressistas e libertadores no Brasil. Mas, não acredito em vazios prolongados, penso que a direita neoliberal mais cedo ou mais tarde reassumirá o poder político, que já exerce hoje no Congresso, mas o caldo político será favorável para o fortalecimento de alguma sigla nova de esquerda, ou quem sabe de uma frente de siglas populares capaz de enfrentar o poder neoliberal e o PT.

quinta-feira, 4 de junho de 2015

BRASIL, QUANDO A LEI ÁUREA SERÁ ENTENDIDA?

Nos anos da minha infância me ensinaram que o Brasil havia extinguido a escravidão através da Lei Áurea, assinada pela Princesa Isabel, em 13 de maio de 1888.
 
Eu nunca fui estudante brilhante, do tipo que as pessoas comentam - essa criança é um gênio!!! Acho mesmo que eu era do tipo tardio, aquele cara que demora um pouco mais que a média para compreender algo.
 
Mas, o que me lembro mesmo é que a tia Glória, uma das minhas queridas professoras do antigo primário, ensinava que o Brasil tinha abolido a escravidão e todo dia 13 de maio havia apresentação de trabalhos feitos em cartolinas sobre a abolição, sobre a Princesa Isabel etc.
 
Confesso, talvez por ter sido do tipo tardio, ou pelo estilo decoreba que se aplicava no ensino de assuntos históricos e sociais, estou falando dos anos 70, que eu não sabia o que significava ser escravo, portanto eu não sabia o que significava a abolição. O que eu sabia, por ver nas fotos dos livros é que só havia escravo negro.
 
Eu fiz o primário num colégio particular e me lembro bem da minha turminha. Posso afirmar sem medo de estar sendo traído pela minha memória que de um total de 20 a 25 crianças, apenas uma era negra.
 
Eu não conseguia juntar uma coisa(escravidão) a outra(apenas um negro numa turma com mais de vinte crianças).
 
Ora, o que realmente educa é o empenho dos pais, parentes e professores para que as crianças consigam refletir, analisar, interpretar e pensar num padrão de causa(s) e consequência(s). Isso independe da idade. Não importa se são crianças, adolescentes, adultos. O processo educativo deve ser contínuo, humanista e integral.
 
A nossa educação, de um modo geral, não incentiva a liberdade de reflexão. Em História, Geografia, Estudos Sociais, durante décadas a ditadura militar fez o país desaprender como é que se estuda tais áreas do conhecimento. E é obvio, que mesmo com o fim da ditadura o estrago já estava feito, pois os professores que viriam a dar aulas nos anos 80 e 90 em grande parte tinham sido formados pela forma do factual decoreba e com temáticas proibidas na área das ciências humanas.
Anteontem, dia 2 de junho de 2015, a Presidenta Dilma assinou a PEC dos trabalhadores domésticos, em sua  maioria composta pelas empregadas domésticas.
 
O assunto ficou cerca de três anos sendo discutido, pois a famosa classe média chiou e esperneou quando Dilma no seu primeiro mandato remeteu a PEC para o Congresso. Ah, o Congresso, poucos ali se atrevem a contrariar a classe média. Agradar a classe média é praticamente sinônimo de reeleição.
 
As ameaças de demissão das domésticas foram a primeira reação de boa parte da classe média. Pagar mais? limitar a carga horária, ter que assumir compromissos legas com assinatura de carteira de trabalho?.......Não, isso é demais. Com os impostos já "pagamos o bolsa família" para "quem não quer trabalhar" e agora mais essa, direitos trabalhistas para as empregadas!
 
Pobre país, gigante, porém apequenado pela ignorância. A parte da classe média mais ignorante é aquela que nunca aprendeu ao longo da sua educação que o quartinho da empregada, normalmente um cubículo e o restante da casa com quartos maiores, nada mais é do que uma versão do século XX para a casa grande e a senzala.
 
Qual a percentagem de negras entre o total de empregadas domésticas? Não vou responder. Vou apenas dizer que a parte mais ignorante da classe média jamais conseguiu refletir sob a forma de causa e efeito para ligar a escravidão e a forma como ela foi abolida no Brasil com o fato de a grande maioria de empregadas domésticas ser composta por mulheres negras!
 
Em matéria do dia 3 de junho na página 21 do jornal O Globo sobre a sanção da nova lei, o jornal entrevistou o professor e pesquisador da FGV Rodrigo Leandro de Moura. Segundo o jornal relatou o notório professor disse que a regulamentação da PEC não deveria ter sido feita agora. Diz o professor "A PEC vai aumentar o custo das famílias em empregados domésticos. Não acredito em aumento da formalização, mas na queda da ocupação e aumento da informalidade, e substituição da empregada por diaristas."
 
Professor Rodrigo, o assunto antes de ser econômico é de princípios. Princípios ligados a busca pela igualdade de direitos, ligados a busca pelo respeito aos empregados domésticos e resgate histórico de uma parcela ainda muito tímida do que o Brasil desenvolvido e intelectualizado como o notório professor citado deve, de débito, aos negros e a outros grupos de explorados como o povo do sertão nordestino.
 
E, se houver queda da formalidade na realização trabalhista, será por mesquinharia. E se houver substituição em massa por diaristas, será a comprovação de que a Lei Áurea não foi entendida e não há nada para ser comemorado nos dias 13 de maio de cada ano.