quinta-feira, 25 de junho de 2015

POESIA: O AÇUDE

Já faz algum tempo que não publico poesia. Que tal uma do adorável Thiago de Mello? Saboreiem sem nenhuma moderação.
 
 
O Açude            (Thiago de Mello)
 
Não sei nem jamais
saberei o nome
(se acaso tem nome)
do bicho que dorme
no escuro do açude
sem fundo que sou.
 
Nascido, senão
comigo, de mim,
é um bicho, ou como
se fosse; e que dorme.
 
Talvez o agasalhem,
de sono enrolado,
as mais fundas águas
que em minha alma dormem:
- as águas e o bicho,
num sono só, feito
de grávidos nadas
espessos e imóveis.
 
Mas nem sempre imóveis.
 
Um dia estremecem:
sem causa, e de súbito,
um tremor percorre,
longínquo, levíssimo,
o nervo das águas,
- essas águas fundas
que enrolam, dormidas,
o sono do bicho,
que já não é sono:
mal findo o arrepio,
começa a lavrar
o incêndio no açude.

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