sábado, 6 de dezembro de 2014

CRÔNICA DE UMA SOCIEDADE DOENTE

Hoje, saí para dar uma caminhada e comprar um perfume para presentear uma tia que fez 96 anos e continua, que ótimo, exigente quanto aos aromas que usa diariamente para manter o seu sempre incontestável charme e principalmente a autoestima.
 
Ao me aproximar de um shopping para fazer a minha pequena compra, pensei que estava numa feira esquizofrênica.
 
Pedestres atravessavam numa faixa para eles, num local sem semáforo, enquanto motoristas atrás da faixa buzinavam seus carros ensandecidos. A loucura maior é que do terceiro veículo para trás não dava para os outros três ou quatro veículos enfileirados verem por que o trânsito estava momentaneamente parado. Ah, mas o primeiro e o segundo motoristas tinham pleno conhecimento do que ocorria a sua frente.
 
O primeiro motorista da fila foi, entretanto, o primeiro a buzinar "saiam da frente pedestres!!!" e aí como num efeito dominó as buzinas se espalharam até o último veículo.
 
Por estar numa situação de descontração, dei um pouco mais de atenção a pintura grotesca, consciente de que ela faz parte da paisagem. Nada de anormal estava acontecendo ali, tudo nos conformes. Quando a faixa de pedestres ficou livre, o primeiro motorista arrancou cantando pneu, com cara de fúria e cheio de razão!!!
 
Então, prossegui alguns passos até a entrada do gigantesco shopping,  caminhando a passos moderados. Que erro!!! Quase fui atropelado por pessoas que entravam naquele contêiner de lojas. Gente falando ao celular de quem tomei pisão no pé, gente em alta velocidade esbarrando em todos para entrar rapidamente, pessoas que no meio disso tudo resolveram parar para conversar bem na entrada e aí detonaram um literal engavetamento de pessoas e foi por aí o festival insano de uma sociedade que só pode estar doente. Muito doente.
 
A imagem acima não precisa de explicação, apenas de um adendo: o individualismo consumista, que já é suficientemente grave, agora também é míope.
 
"Vi de um tudo" no shopping. Corredores lotados, lojas fervilhando de supostas promoções, vendedores puxando consumidores para dentro das lojas, fila para usar banheiro, fila para usar o caixa eletrônico, fila para ser atendido, fila para pagar a conta, mas todos felizes com suas sacolas cheias de "coisas novas" e bonitas!!!
 
Após comprar o perfume para a minha tia, encontrei uma amiga que trabalha com Psicologia Econômica. É uma arma científica para a reflexão pessoal sobre o uso consciente do dinheiro, do patrimônio, dos recursos, etc; resumindo de maneira bem superficial.
 
Batemos um rápido papo e assim como eu, ela observou tudo o que se passava e comentou "hoje em dia a pessoa é o que consome e tem seu valor pessoal medido pelo quanto consome". Provocativo, perguntei, "e quem não consome?" rapidamente veio a resposta - "está fora do sistema, não existe".
 
Eu já sabia qual seria a resposta dela, assim como sei que não adianta tratar sintomas. A solução passa inevitavelmente pela cura da doença, que responde pelo nome de CAPITALISMO. No entanto, fiquei arrependido de ter comprado um sabonete líquido que a vendedora me convenceu a levar para fazer um "conjuntinho com o perfume".
 

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