domingo, 1 de março de 2015

RIO DE JANEIRO: UMA VIAGEM ATRAVÉS DA HISTÓRIA

Dedico este texto a professora Vera Moraes, que em curso superior me deu aulas de História do Rio de Janeiro e foi com quem fiz meu primeiro trabalho de campo, saindo pelas ruas do centro do Rio e adjacências com bloquinho, caneta e máquina fotográfica.
 
Quero te fazer um convite. Hoje, 1 de março de 2015, a cidade do Rio de Janeiro faz 450 anos. A rigor, a data da fundação, que é 1 de março de 1565, é uma data símbolo. Antes, já havia portugueses e índios vivendo por aqui de forma organizada e inclusive com a presença de padres e franceses.
 
O fato é que hoje se comemora o aniversário da fundação da cidade, uma data muito mais invocada como símbolo da expulsão dos franceses do que propriamente da fundação, mas que "funda o Rio de Janeiro" efetivamente como cidade colonial portuguesa.
 
Volto ao convite. Ainda não o fiz, não é? Que tal voltarmos ao século XVI e caminharmos até onde der, fazendo um passeio pela história da cidade? Quero ir lá atrás e fazer uma caminhada até o século XIX ou no máximo até o início do XX.
 
Sei que hoje várias homenagens serão feitas. Muitas exaltando a indiscutível beleza única da cidade. Por isso, quero pegar sua atenção para outros aspectos e conduzi-la por uma viagem no tempo. O que permite, inclusive, compreender melhor como chegamos até o dia de hoje com os problemas e as virtudes da Cidade Maravilhosa!
 
Antecedentes
 
Depois da vinda de Cabral, Portugal levou cerca de três décadas para começar a mandar expedições colonizadoras para o Brasil. É sempre bom lembrar, que estou contando a história do ponto de vista do Brasil de hoje. E chamo a atenção para uma palavra que talvez eu vá usar algumas vezes, que é colonização. Aqui, neste chão que chamamos Brasil, fora território de diversos povos que aqui fincaram moradia, descendo da América do Norte e da costa oeste da América Sul. Portanto, a colonização portuguesa e a presença de outros povos europeus irá dizimar alguns povos e descaracterizar a cultura de outros.
 
Efetivamente, somente em 1549 o rei de Portugal, Dom João III, iniciará de fato a colonização do Brasil com a criação do cargo de Governador Geral da Colônia. O primeiro viria a ser Tomé de Souza.
 
Curiosidade => A primeira expedição portuguesa a chegar no litoral do Rio de Janeiro, data de 1 de janeiro de 1502. Por ter sido em janeiro, os portugueses batizaram a baia que dá acesso ao litoral de "Rio de Janeiro". Naquela época, a palavra rio não se limitava a hidrografia de água doce; uma baía ou fundo de baía também eram chamados de rio. Os índios que viviam no litoral do Rio de Janeiro chamavam de Iguaá-mbara(água que se esconde). Dessa palavra surge a palavra Guanabara, que batiza a nossa hoje tão poluída baía.
 
A Fundação da Cidade
 
Em 1555, os franceses ocuparam a cidade. Para encurtar não vou me ater ao fato. Para o objetivo da nossa "viagem histórica" o que importa é que os portugueses sob ordem do Governador Geral, começam em 1565 um processo de retomada do território carioca. Para criar um clima favorável, Estácio de Sá, enviado para acelerar a expulsão dos franceses, declara fundada a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro num trecho de praia entre os morros Pão de Açúcar e Cara de Cão. O episódio está descrito numa carta escrita pelo Padre Anchieta, que fazia parte da comitiva do Estácio de Sá.
 
A batalha contra os franceses se estendeu até 1567. No dia 20 de janeiro (dia de São Sebastião), Estácio de Sá lançou, com apoio dos índios tupiniquins, o ataque derradeiro.
 
Apesar da fundação formal ter ocorrido na região da Urca(Praia Vermelha), o núcleo da cidade passa a ser o morro do Castelo, que sediou os principais prédios administrativos da cidade e a Igreja Colégio dos Jesuítas, que infelizmente não existe mais, pois séculos depois o morro foi removido.
 
O núcleo central da cidade se dividiu em quatro morros e entre eles: Castelo, Santo Antônio, São Bento e Conceição.
 
Nessa época, a população do Rio era de aproximadamente 3.850 habitantes, sendo a maioria de nativos.
 
A Praça XV do século XVI ao século XVIII
 
A vida da cidade ocorria entre os quatro morros e o principal ponto de encontro comercial, de festas era a hoje chamada Praça XV, a época chamada de Largo do Rossio ou Terreiro da Polé, pois lá havia o pelourinho. Tentem sentir, nas palavras de Vivaldo Coaracy como eram intensos os acontecimentos no largo do Rossio: "...testemunha e cenário dos mais variados acontecimentos, trágicos e cômicos, solenes e vergonhosos; que passou por mais profundas transformações; que conheceu uma galeria policroma de personagens, desde os que deixaram os nomes inscritos nas páginas da grande história até as mínimas criaturas anônimas confundidas no lado das sarjetas, foi o Largo do Rossio."
 
Nas suas redondezas foi construída a primeira rua, a rua Direita (hoje chamada de Primeiro de Março), igrejas, ermidas etc. Das igrejas construídas no século XVI sobrou o Mosteiro de São Bento, obra iniciada em 1590.
 
É impossível contar a história da fundação do Rio sem dar atenção especial a Praça, que em seguida ficou conhecida como Praça do Carmo, pois ali se instalaram os Carmelitas no século XVII.
 
Além disso, a Praça era um porto. Principal porto da cidade durante muitos anos. Abrigava a casa do Governador, o prédio da Cadeia (atual Assembléia  Legislativa), o Senado da Câmara, incendiado em 1790 e o famoso, até hoje, Arco dos Teles (sobrenome de uma família influente a época).
 
Os dois primeiros chafarizes da cidade ficavam na Praça. O último deles está lá até hoje e suas linhas artísticas foram feitas por Mestre Valentim.
 
A vida social concentrava-se entre a rua Direita e a Praça e a programação era quase toda católica.
 
A vida comercial também tinha o mesmo "point". Mercado de peixes, ambulantes, normalmente escravos, oferecendo frutas, comidas prontas, doces etc. O burburinho comercial quase sempre se misturava ao choro dos novos escravos arrancados das suas terras e trazidos por embarcações que atracavam na Praça.
 
A importância da Praça vai num crescente e seu apogeu se dá no século XIX com a chega ao Rio da família Real.
 
As Consequências da união Ibérica para a Cidade do Rio de Janeiro
 
A União Ibérica dura de 1580 a 1640. tempo suficiente para interferir nos negócios da Holanda, que vivia da (re)venda do açúcar. A União restringe as áreas de comércio da Holanda, que responde invadindo a Bahia, sem sucesso e depois Pernambuco onde ficam por 24 anos!
 
E o Rio com isso?
Com Pernambuco nas mãos dos holandeses, Portugal volta-se mais para o sul do território brasileiro. Com isso o Rio vai se tornando o ponto de comando das ações portuguesas.
 
Em 1640, Portugal consegue desfazer a união Ibérica e entrona uma família real reconhecida rapidamente pelo Governo do Rio de Janeiro. Durante três noites ocorreram festas, desfiles de cavaleiros e carros ornamentados. Alguns historiadores consideram o episódio como o primeiro carnaval da cidade do Rio de Janeiro.
 
A essa altura, o porto do Rio de Janeiro, na Praça do Carmo (Praça XV) passa a ser o principal porto do país, inclusive para escoamento das riquezas retiradas da região espanhola de Buenos Aires.
 
Século XVIII: O Fortalecimento da Burguesia Mercantil
 
"Na fundação da cidade do Rio de Janeiro estava marcado o destino mercantil da cidade"
                                                                                                              Eulália Lobo
 
As figuras centrais das classes dominantes são os produtores de cana-de-açúcar e outros produtos primários e os comerciantes (atravessadores), que vão ganhando importância e já no século XVIII acumulam mais renda do que os produtores primários.
 
Os comerciantes passam a ter domínio dentro da Câmara Municipal. O Colégio eleitoral que formava a Câmara vai dando para ela uma cara cada vez mais urbana, sob o argumento de que os produtores rurais tabelavam preços.
 
A Câmara, entretanto, é que passa a trabalhar pelos interesses dos comerciantes, chegando, por exemplo a fixação de preços de fretes; tal função anteriormente era do Governador. Quando me refiro a comerciantes, estou me referindo a atacadistas e exportadores.
 
O poder da Câmara chegou até a mexer com interesses da burguesia da metrópole. Dois exemplos:
a) fixação de imposto de 3% para custear frotas comboiadas por naus de guerra e
b) contratação de navios estrangeiros de maior porte para levar a produção para Portugal
 
Como a balança comercial, por determinação de Portugal, tinha sempre que ser desfavorável ao Brasil, os meios de pagamento se tornam escassos e os Comerciantes passam a receber parte do pagamento dos produtores sob forma de açúcar, que com isso se desvaloriza internamente.
 
A Câmara assume tanto poder que cria uma casa da moeda para suprir a falta de meios de pagamento e acabar com o uso do açúcar para tal.
 
A burguesia a que me refiro, é carioca. O seu poder se espalha por todo o país, pois o centro de operações militares também está no Rio, em virtude do período de perda do controle português sobre o nordeste.
 
O passo seguinte para o desenvolvimento da burguesia do Rio de Janeiro está na implantação de indústria açucareira e naval, neste caso impulsionado pelo crescente movimento do porto da cidade, com ligação direta com o Reino, com colônias africanas e asiáticas e a Bacia do Prata.
 
Com a movimentação para dentro das Minas Gerais, o Rio passa a ser o receptor do ouro que irá para Portugal e vende para o interior sal, farinha, escravos, ferramentas etc.
 
Com a volta do controle "normal" de Portugal sobre a Bahia e principalmente Pernambuco, a cidade do Rio de janeiro faz comércio com o nordeste e consegue impor balança comercial favorável aos cariocas. Em troca de coco e tabaco, o Rio vendia mandioca, feijão, milho, arroz, queijos de Minas Gerais, cachaça, toucinho etc. Os nordestinos pagavam o déficit em dinheiro.
 
Na segunda metade do século XVIII, com a queda da produção aurífera, Portugal aumenta o seu interesse em negociar com a região do Prata. Nesse período o Rio de janeiro está no auge do seu poder econômico e é o centro governante de todas as terras do sul, inclusive a colônia do Sacramento (atual Uruguai).
 
Com tamanho poder militar e burguês, e sua posição privilegiada como porto, a cidade do Rio de Janeiro é declarada capital da colônia em 1763.
 
Um Pouco Sobre o Século XIX
 
O século é marcado pela chegada da família real. As embarcações chegaram ao Rio em 7 de março de 1808.
 
A antes Praça do Rossio, da Polé, do Carmo, agora passa a chamar-se praça do Paço.
 
De capital da colônia, nos 13 anos em que a família real ficou no Brasil, a cidade do Rio de Janeiro tornou-se capital do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. E mais uma vez, o centro do poder estava na Praça.
 
Algumas instituições criadas na cidade para cumprir com o seu novo papel: Intendência Geral da polícia, Teatro de São João, novas linhas de abastecimento de água, Biblioteca Real, Imprensa Régia, Escola Médica, Academia de Marinha, Banco do Brasil, Fábrica de pólvora, dentre várias outras instituições.
 
Mesmo com o retorno da família real para Portugal, o Rio de Janeiro continuou sendo o centro político do Brasil.
 
Em maio de 1822 Dom Pedro recebe o título de defensor perpétuo do Brasil e juntamente com a convocação da Assembléia Constituinte Brasileira em junho, foram acontecimentos que precipitaram a Proclamação da independência.
 
Pedro II foi aclamado Imperador em outubro e em novembro a nova bandeira foi benzida e içada. Nascia, pelo menos simbolicamente, no centro da cidade do Rio de Janeiro, um país.
 
Finalizando....
 
Deixei de falar sobre muitas coisas. Fiz o resumo que pude para não tornar o texto cansativo. Mas, a história da cidade continuou, a Praça do Paço, virou Praça XV depois da proclamação da República.
 
A Praça, ah a Praça! Ela tem muito mais histórias para contar.
 
Feliz aniversário, Cidade Maravilhosa !!!

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